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Organizadores: Márlio Aguiar (UFPR) e Mariana Marchi Malacrida (UFSC)
Resumo: Em uma famosa conferência ocorrida em 1966 denominada “As consequências da renovação da história dos direitos antigos” o historiador italiano Arnaldo Momigliano anunciava o fim da História do Direito como ramo autônomo de investigação histórica e a absorção integral daquele ramo de saber por outro (àquela época, a História Social). Para ele, àquela altura deviam ser reconhecidos como incompreensíveis os aspectos institucionais do Direito quando desacompanhados de apreciação do quadro de referências mais amplo de uma sociedade, o que teria tornado inútil até mesmo a distinção até então vigente entre uma análise técnico-dogmática dos discursos do direito e uma análise histórica, por exemplo, das instituições jurídicas propriamente ditas nas sociedades antigas. O objeto de crítica era claro: de um lado, historiadores como Momigliano permaneciam céticos quanto ao uso de uma terminologia teórica no mais das vezes universalizante e unificadora para análise da “dimensão jurídica”, especialmente quando permeada pela visão tendencialmente anacrônica e homogeneizante dos juristas contemporâneos acerca do universo normativo, dos conceitos de direito e de justiça. No entanto, muitos desenvolvimentos nas últimas décadas demonstraram ser possível concordar com as críticas feitas à historiografia jurídica tradicional – especialmente àquelas voltadas ao mundo antigo e medieval – sem alcançar a conclusão metodologicamente mórbida de Momigliano e, por assim dizer, buscar um caminho mais construtivo.
O Direito, no entanto, não está tão somente, como pensava Momigliano, “imerso” no social; como sublinhava António Manuel Hespanha, o Direito também imerge a dimensão social, na medida que sua produção é, em si mesma um processo social relacionado com os demais espaços sociais. Dentro do campo jurídico, as práticas discursivas dos juristas e os dispositivos do direito dão ênfase a uma estrutura relativamente objetiva e autônoma do direito que, analisada de modo historicamente rigoroso, auxilia a trazer à luz práticas sociais das mais diversas a partir de suas fontes. Valendo-se das categorias produzidas pelo discurso jurídico, de sua terminologia, da produção historicamente localizada de ordenamentos, práticas e hábitos interpretativos, a análise histórica da dimensão jurídica torna possível sublinhar nas fontes jurídicas fenômenos sociais que, de outra forma, poderiam passar invisíveis. Partindo do pressuposto de que a história do direito – nas diferentes modalidades em que pode ser pensada e construída – apresenta um ponto de vista sobre o real, são muitos os diálogos que pode produzir com as diferentes intersecções da História da Antiguidade.
A proposta deste Simpósio Temático é de promover do modo mais amplo possível debates que conectem diferentes faces do estudo histórico-jurídico com as historiografias voltadas às sociedades antigas, bem como as discussões referentes à metodológica, aos aportes teóricos e ao uso de fontes que permitam a conexão dessas áreas de saber. Nesse sentido são esperadas propostas que de algum modo abordem temas ligados à: História da Cultura Jurídica – História das Práticas Jurídicas – Procedimentos Judiciais e Histórias Processuais – As relações entre Direito e concepções de Justiça na história Antiga – Fontes do Direito – História dos juristas, advogados, rábulos, praxistas, sacerdotes – História das representações jurídicas nas sociedades da Antiguidade – História das instituições – Direito, História e Memória – História Antiga e Usos do Passado na História do Direito – História da Historiografia Jurídica ligada às sociedades antigas.
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